Este filme é um drama muito interessante, profundo, comovente, inquietante e intenso. Envolve conflitos pessoais da meia-idade, casamento e dinâmicas familiares. Dirigido por Marc Turtletaub, o longa traz Kelly Macdonald no papel da protagonista Agnes. Ela é uma dona-de-casa casada, mãe de dois filhos, que vive uma vida comum à média das famílias norte-americanas. Com um filho jovem ainda morando em casa e outro em idade de entrar na faculdade, sua única função é cuidar da casa, do marido e dos filhos. Seu cotidiano envolve serviços na igreja, compras no mercado, preparo de refeições e fazer os caprichos de cada integrante de sua família. Por serem descendentes de imigrantes húngaros, ainda há um grande peso de tradição presente ao seu redor. A família mora na casa que ela herdou dos pais. Seu marido é dono de uma pequena oficina mecânica e está satisfeito com a distribuição de tarefas de cada um em sua casa: o filho mais velho é responsável por ajudar na oficina, o filho mais novo, visto como o “mais inteligente”, deve ser o que conseguiria entrar na faculdade e a esposa é o suporte dentro de casa para que tudo isso possa dar certo.
Logo de cara, somos tomados por um grande desconforto ao perceber que Agnes não está à vontade com a sua vida, mas provavelmente ainda não se deu conta disso. A cena inicial exemplifica bem a situação. Trata-se de uma festa de aniversário, ela é a única que está trabalhando para tudo dar certo e então percebemos que é seu próprio aniversário. Tudo começa a mudar quando ela ganha de presente um quebra-cabeças de mil peças e, quando se põe a montá-lo, percebe que possui facilidade para isso. Na verdade, o quebra-cabeças é um gatilho que a fará questionar sua própria vida, seu papel, suas opções. Ela acaba sendo convidada para participar de um campeonato de quebra-cabeças ao se envolver com outro jogador, Robert, interpretado por Irrfan Khan. Isso afetará profundamente sua dinâmica familiar e mudará sua vida.
Os conflitos que ocorrem no filme surgem por conta da falta de reflexão que os personagens possuem sobre sua própria vida. O marido é o símbolo do americano médio. Não fez faculdade, está satisfeito com sua oficina, sua família em casa com a esposa cuidando de tudo, sua casa no lago para pescar em momentos de descanso e seus filhos com o futuro traçado por ele mesmo. Tem como meta ser um bom marido, atencioso, carinhoso diferente de seu pai que, pelo que tudo indica, era violento com sua mãe. Possui uma visão de mundo fechada, não aceita que os filhos tenham profissão “de mulher”, decide o que a esposa pode ou não fazer, não assiste a noticiários, não quer saber o que acontece com os outros. Por ser o único personagem que se recusa a refletir, esse marido se mantém estável e não consegue compreender as mudanças que estão ocorrendo com sua esposa e seus filhos. Agnes até então não havia refletido porque ela não conhecia absolutamente nada sobre o mundo. Casou cedo e estava envolvida apenas com a família e a igreja. Fazia tudo de forma mecânica até ter o insight proporcionado pelo contexto do quebra-cabeça. Ao se perceber no mundo, ela também começa a perceber as contradições de toda a família e ver a dor dos filhos. Ambos também estavam em crise por não terem aptidão para ser aquilo que o pai queria. O filme deixa claro que não há nem vilões nem inocentes. Todos tentam acertar e ser o melhor que a sociedade espera deles, porém pecando exatamente nos mesmos vícios desta sociedade: pensamento raso, machismo, falta de empatia, egoísmo, prepotência, etc.
O filme retrata também algo que muitos conselheiros de casais sempre afirmam: a mulher quando casa não pode esperar que o homem mude, porque raramente isso acontece. O homem quando casa não pode esperar que a mulher permaneça igual, porque raramente isso acontece. Homens possuem a tendência de serem mais estáveis, já as mulheres mais dinâmicas e reflexivas. Isso quer dizer que acordos e combinações feitas no início do casamento não podem valer para toda a vida, pois muita coisa pode mudar. No filme vemos uma mulher questionando muitas coisas e o marido lutando para tudo ficar como sempre foi. Essa falta de compreensão do outro e do momento do outro pode ser um fator decisivo para o fracasso no casamento. A Bíblia diz para os maridos amarem a esposa como Cristo amou a igreja e deu sua vida por ela (Efésios 5:25). Se Cristo abriu mão da própria glória e morreu como escravo pela igreja, os maridos devem abrir mão de muitos dos seus pontos de vista para poderem honrar as esposas.
Da mesma forma os pais com relação aos filhos. O adolescente pode mudar de ideia ao longo dos anos e não querer mais seguir a vida que sempre falou que seguiria, ou que os pais o estavam pressionando para seguir. Como indivíduos, precisamos refletir muito sobre nossas reais motivações e os motivos de nosso desconforto para sermos pessoas sinceras e autênticas e também para não sermos vítimas dos nossos próprios impulsos enganosos. Como família, precisamos conversar uns com os outros e estarmos abertos não só ao diálogo, mas também às mudanças que o diálogo pode trazer. Esse é um bom caminho para uma família saudável. Voltar atrás, mudar de ideia em prol do outro é um ato de amor. Já fechar o diálogo e não aceitar mudanças é um ato de egoísmo.
“Sejam sempre humildes, bem educados e pacientes, suportando uns aos outros com amor. Façam tudo para conservar, por meio da paz que une vocês, a união que o Espírito dá”. (Efésios 4:2,3)