A vida em família é um filme italiano que se utiliza do humor para lidar com profundos questionamentos humanos e demonstrar possibilidades de redenção. Infelizmente, a tradução do título em português não é boa. Temos no original o título La vita in comune, pois o filme tem como tema a vida em comunidade. O que a princípio pode parecer uma sátira da vida cotidiana em uma sociedade de cidade pequena nos pega de surpresa ao analisar o ser humano e seus relacionamentos de uma maneira muito bela e poética. Quem assistir a esse filme viverá momentos muito agradáveis e tocantes, e com certeza manterá a temática no pensamento por algum tempo.
O filme narra de forma bem-humorada a vida na cidade de Disperata, uma cidade minúscula à beira-mar no sul da Itália onde nada acontece e, na maior parte do tempo, os homens nada têm para fazer. Passam as horas no bar ou dormindo em cadeiras na praça. Inclusive, o nome da cidade, em italiano, significa “infeliz” ou “desesperada”. As opções dos moradores acabam sendo as intrigas políticas, as fofocas de vizinhança ou até mesmo a violência como tentativa de escapar à calmaria e trazer algum tipo de relevância à vida. A narrativa é construída com o entrelaçar de histórias de alguns moradores locais, entre eles o prefeito amante de poesia sem talento para governar, a vereadora mãe e dona da mercearia e seu ex-marido, que compõe uma dupla de ladrões com o próprio irmão.
Parece que a cidade inteira é tomada pela sensação de inutilidade. Até as brigas políticas têm como foco a relevância local. Um grupo querendo construir um resort turístico e outro buscando manter um santuário natural. Se o prefeito, a maior autoridade na cidade, é alguém deprimido porque está em uma ocupação para a qual não possui vocação, imaginem os demais moradores… A maneira como alguns personagens encontram seu propósito na vida como redenção é algo que nos faz pensar e pode servir de lição. Encontramos redenção pela arte, pelo serviço ao próximo e pelo amor.
(Este parágrafo contém spoiler; caso não queira ler, é só pular para o próximo.) A narrativa se inicia quando um dos ladrões mata um cachorro e se sente tão culpado que se entrega para a polícia, o que mostra que ele era um homem sensível e que estava no crime porque não conhecia outra alternativa para ser relevante. Quando na prisão lhe é apresentada a poesia, ele automaticamente muda suas atitudes e passa a ver o mundo de outra forma. Seu irmão, comparsa de crimes que reluta em mudar, é transformado quando recebe uma ligação do papa Francisco, homem que venerava. O papa diz que o segredo da vida é cuidar das pessoas e da criação de Deus, o que imediatamente ele começa a fazer. Assim, os dois irmãos passam a se preocupar sinceramente com as pessoas da cidade e com os animais e acabam lutando por justiça. O prefeito não aguenta o fardo de governar e não percebe que ele é feliz apenas quando está fazendo trabalho voluntário na prisão, ensinando poesia aos presos. Ele é alguém que já encontrou sua relevância mas ainda não sabe, pois ainda tenta obtê-la pelo cargo que ocupa.
A simplicidade dos personagens ou até mesmo a ingenuidade é gritante , mas é exatamente isso que torna a narrativa tão especial. É exatamente nessa simplicidade que os personagens descobrem o sentido da vida. O filme ensina que não precisamos de grandes atos para sermos alguém e nos sentirmos relevantes. Muitas vezes, mesmo morando em grandes centros urbanos, questionamos nossa relevância e lembramos que gostaríamos de ter alcançado muito mais sucesso do que alcançamos. Essa sensação acaba tirando nossa paz e nosso foco daquilo que realmente importa. Basta cuidarmos de quem está perto e preservarmos a criação de Deus. Para isso, precisamos mudar nossa visão de mundo e nossa maneira de pensar.
“O Senhor já nos mostrou o que é bom, ele já disse o que exige de nós. O que ele quer é que façamos o que é direito, que amemos uns aos outros com dedicação e que vivamos em humilde obediência ao nosso Deus.” (Miqueias 6:8)
“Mas entre vocês não pode ser assim. Pelo contrário, quem quiser ser importante, que sirva os outros, e quem quiser ser o primeiro, que seja o escravo de todos. Porque até o Filho do Homem não veio para ser servido, mas para servir e dar a sua vida para salvar muita gente.” (Marcos 10:43,45)